quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O sms.

  Nós vivemos uma época acelerada, publicitária, aforística. Uma época de coisas transitórias, da síntese e da rapidez. Não há tempo. Viro-me para o lado e encontro gente com horários planificados, como se fossem kolkhozes soviéticos. Romances de 500 páginas são um anacronismo. Tudo o que demore horas representa um custo insuportável e os melhores são quem os executa mais depressa. Por isso, nesta civilação obcecada com o movimento não surpreende que que as mensagens de telemóvel, os famosos SMS, sejam tão populares. Esta forma de comunicação curta e abreviada adaptou-se com perfeição à vida das pessoas. Há quem desconfie dos SMS, argumentando com a trivialidade e com a ortografia da coisa. Eu gosto de enviar e receber SMS, porque penso que a maioria do que temos para dizer aos outros não justifica um telefonema. Chega uma frase, uma palavra, uma insinuação. E cada um vai à sua vida.
  Mas parece-me útil deixar um aviso: os SMS transportam perigos sérios em que devíamos meditar. Por duas ou três vezes enviei mensagens erradas. Já fui salivante com amigos machos. Já insultei quem não merecia. E um ou outro amigo quase implodiu a vida dele por ter falhado o número de destinatário. Não se trata de desumanização própria deste meio de escrita (a nossa desumanidade não tem cura). É a hipótese de erro irreparável, da grosseria sem retorno, da imagem destruída. O telemóvel pôs-nos mais perto uns dos outros, mas os SMS, como aliás os e-mails, são uma ameaça ao nosso direito ao erro, à nossa repulsa pelo rigor a à infalibilidade. As velhas cartas que escrevíamos não eram uma ameaça. Podiam ser destruídas enquanto não chegassem ao destino. O carteiro podia falhar. O remetente podia enganar-se. Os destinatários podiam ausentar-se de casa. Equívocos, desencontros, tudo isso era frequente. Conheço casamentos  que se salvaram por cartas transviadas, porque, simplesmente ela não chegou a ler. Os SMS são instantâneos e provocam estragos estantâneos. Cuidado.


Pedro Lomba, in Diário de Notícias, 29 de Julho de 2000;

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